O cenário econômico global segue em constante estado de expectativa diante dos sinais emitidos pelo Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos. Nos últimos dias, uma fala da presidente do Fed de São Francisco, Mary Daly, reacendeu as discussões sobre os cortes nos juros nos EUA. Em um discurso proferido no Fisher Center for Real Estate & Urban Economics da Universidade da Califórnia, ela demonstrou uma postura cautelosa quanto às reduções nas taxas de juros ao longo de 2025, alertando que os riscos inflacionários ainda exigem atenção redobrada.
Embora Daly tenha reiterado estar confortável com a possibilidade de dois cortes nas taxas ainda neste ano, sua declaração trouxe uma nota de prudência ao afirmar que, dadas as atuais pressões inflacionárias, o banco central norte-americano pode ser forçado a postergar ou até limitar o número de cortes. Essa análise torna-se ainda mais relevante quando se considera o ambiente político instável, especialmente diante das recentes tensões entre a política monetária do Fed e as decisões comerciais do governo Trump. Em particular, Daly enfatizou que a trajetória da inflação continua acima da meta e que os riscos se elevaram consideravelmente desde o ano anterior.
A fala de Daly revela uma postura de firmeza diante de um dilema crucial. O Fed precisa equilibrar a responsabilidade de promover crescimento sustentável com a necessidade de conter a inflação. A lógica por trás dessa resistência a cortes precipitados é clara: baixar os juros sem garantias reais de que a inflação está controlada pode reaquecer uma economia que já está operando perto de sua capacidade máxima, colocando em risco a estabilidade de preços — um dos mandatos centrais do banco central.
A Política Monetária Entre Cautela e Pressão Política
A tensão entre as metas técnicas do Federal Reserve e as pressões políticas externas nunca esteve tão visível. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, voltou a demonstrar insatisfação com a condução da política monetária, especialmente após o anúncio de que os cortes nos juros nos EUA podem não acontecer com a velocidade desejada. De acordo com fontes da Casa Branca, há inclusive estudos sendo conduzidos para viabilizar a substituição do presidente atual do Fed, Jerome Powell — um gesto que, se levado adiante, abalaria significativamente a independência do banco central e colocaria a credibilidade da política monetária americana em xeque.
Mary Daly, no entanto, foi enfática ao defender a abordagem “wait and see” — esperar por sinais mais claros antes de agir. Ela sublinhou que a prioridade máxima continua sendo restaurar e manter a estabilidade de preços, mesmo que isso signifique prolongar a política de juros elevados. A taxa de referência está mantida na faixa de 4,25% a 4,50% desde dezembro, e não há, até o momento, uma urgência explícita para reduções.
A presença de tarifas comerciais e incertezas fiscais também complica o quadro. As políticas econômicas do governo Trump, como cortes de impostos, aumento do protecionismo comercial, desregulamentação e novas regras migratórias, têm impacto direto sobre os vetores que o Fed observa: crescimento do PIB, estabilidade do dólar, desempenho do mercado de trabalho e trajetória da inflação.
Inflação Persistente: O Obstáculo aos Cortes nos Juros nos EUA
Daly não deixou dúvidas: o maior desafio atual é a lenta desaceleração da inflação. Mesmo com políticas monetárias mais rígidas, o progresso em direção à meta de 2% do Fed ainda é considerado gradual demais. Isso levanta preocupações legítimas sobre a eficácia dos estímulos monetários num ambiente onde os choques de oferta global, os conflitos geopolíticos e a volatilidade do petróleo continuam alimentando a pressão inflacionária.
Nesse cenário, cortes nos juros nos EUA precipitados poderiam minar os ganhos conquistados até aqui. Além disso, uma economia ainda aquecida, com níveis robustos de emprego e demanda interna, confere ao Fed uma margem de manobra que permite aguardar sem grandes prejuízos. “A economia está indo para onde queríamos, em uma trajetória sustentável”, disse Daly. Ela acrescentou ainda que estima uma taxa de juros neutra — ou seja, que nem estimule nem contraia a economia — em torno de 3%, o que deixa claro que os atuais níveis ainda se encontram em terreno restritivo.
Portanto, mesmo que as condições piorem em um determinado momento, o Fed se vê preparado para agir com flexibilidade, mas sem comprometer seu principal objetivo. Caso a inflação caia mais rápido que o esperado ou o mercado de trabalho comece a mostrar sinais de enfraquecimento, há espaço para mais de dois cortes. Mas o cenário-base ainda é de contenção e vigilância.
Uma Economia Resiliente em Meio à Incerteza
Outro ponto abordado por Daly diz respeito à resiliência da economia norte-americana, mesmo diante de tanta incerteza. De maneira surpreendente, as políticas comerciais e fiscais do governo Trump não provocaram até agora um recuo significativo da atividade econômica. “Não ouvimos muita coisa sobre recuar e se encolher”, disse ela, indicando que as empresas e consumidores seguem confiantes e dispostos a participar ativamente do ciclo econômico.
Essa observação é fundamental para entender por que os cortes nos juros nos EUA não são, neste momento, uma necessidade emergencial. Se a economia estivesse perdendo força, o Fed poderia ser pressionado a agir com mais rapidez para evitar uma recessão. Mas, ao contrário, a força do consumo, o dinamismo do setor imobiliário e a recuperação do setor de tecnologia dão sinais de vitalidade econômica que justificam uma abordagem mais cautelosa por parte da autoridade monetária.
Daly também ponderou que as tarifas prometidas por Trump até agora não se materializaram na intensidade esperada. Isso reduz, temporariamente, o risco inflacionário vindo de aumentos de preços de importação, mas o clima de incerteza ainda pesa sobre as decisões de longo prazo dos agentes econômicos. Para ela, o Fed precisa esperar por mais clareza antes de realizar ajustes de política.

Sou Felipe Ayan, um apaixonado pelo mercado financeiro. Desde cedo, me encantei com o poder que o conhecimento financeiro tem de transformar vidas. Ao longo dos anos, mergulhei de cabeça nesse universo, estudando, investindo e compartilhando tudo o que aprendo.